Quinta-feira, 24 de Janeiro de 2008
“Adventure”, o Rei pescador.
O verdadeiro início do “Adventure” teve lugar na Primavera de 1926 quando o Capitão Jeff Thomas decidiu construir uma nova embarcação e vários capitães e homens de negócios se juntaram a ele na ideia.
Construído em carvalho branco e pinheiro amarelo nos estaleiros de F. James & Son em Essex, Massachusetts, o seu desenho era o de um “knockabout” (escuna sem gurupés), para maior segurança da tripulação. Quando foi lançado à água em 16 de Setembro de 1926, o “Adventure” tinha um dos mastros mais altos (34 metros) da frota de 500 navios em Gloucester, envergava 1830 metros quadrados de vela e estava equipado com um motor de 120 cv. A evolução da escuna de pesca com dóris ao longo dos tempos culminou numa embarcação sem paralelo em beleza de linhas e equilíbrio, capacidade e velocidade.
A origem do seu nome é curiosa. O Capitão estava indeciso e o seu filho havia feito vários desenhos de barcos de pesca aos quais dava sempre um nome. Uma noite o pai pediu para ver os desenhos na esperança de encontrar um nome entre eles. Considerou dois: “Indian” e “Adventure”. Após algum tempo decidiu-se por “Adventure”, pois segundo as suas palavras, “... pescar é uma aventura e não creio que alguma vez outro barco em Gloucester tenha tido esse nome”. Como a história o provaria, o nome foi perfeito.
O “Adventure” levava 14 dóris. Dois homens em cada dóri pescavam com cerca de três baldes de linha de trol com anzóis iscados que no total estendiam-se por quase duas milhas. Por vezes os homens-dos-dóris remavam um par de milhas afastados da escuna para pescar. Consigo levavam um mastro e pau de carga embrulhados numa pequena vela, um par de barris de água fresca, pás, uma buzina de nevoeiro e suportes de remos suplentes. Levavam também âncoras e bicheiros para o peixe, lanternas de querosene e uma vara embandeirada de sinalização. Mesmo assim, com todas as precauções era comum a escuna andar à procura durante horas no nevoeiro, soprando a buzina e escutando a resposta vinda dos dóris perdidos.
O “Adventure” partiu na sua primeira campanha um mês após o bota-abaixo e regressou a casa nove dias mais tarde com 32 toneladas de alabote. Como registo, o “Adventure” apanhou mais peixe e fez mais dinheiro que qualquer outra embarcação na costa Atlântica. Durante mais de 25 anos, o “Adventure” regressaria ao porto vez após vez com o porão carregado até às suas 77 toneladas de capacidade. Foi a escuna mais rentável de todos os tempos, descarregando quase 4 milhões de dólarers em bacalhau e alabote durante a sua carreira de pesca.
Em 1933, mau olhado parece ter vindo a bordo. O “Adventure” bateu num rochedo à entrada dum porto da Nova Escócia durante uma nevasca cegante e permaneceu encalhado durante 36 horas contra mar e vento até o virem desencalhar. Antes disso, teve a tripulação de lançar ao mar 18 toneladas de peixe. No ano seguinte a embarcação teve de ser rebocada até casa quando inexplicavelmente perdeu o leme.
Mas o pior estava para vir. Um mês depois, o Capitão Jeff encontrava-se a 80 milhas ao largo da Nova Escócia, os seus homens fora nos dóris, quando um vento gelado de noroeste se pôs. Começou a formar-se gelo nas amuradas à medida que o repuxo salgado embatia. O Capitão, sózinho no navio com o cozinheiro, desbastou o gelo nas adriças com um malhete de madeira. De seguida foi ao leme, pôs a mão num raio da roda e tombou no convés, morto de ataque cardíaco. O cozinheiro pôs a escuna à feição do vento e recolheu os dóris. O “Adventure” atracou em Halifax com bandeira a meia-haste e toda a Gloucester chorou um dos seus mais capazes capitães.
O Capitão Leo Hynes tinha 33 anos quando foi escolhido entre a comunidade piscatória de Gloucester para tomar o lugar do Capitão Jeff. Mesmo sendo tão novo, Hynes era um marinheiro batido em mais de 20 anos de mar, cedo alistando-se como moço na sua nativa Terra Nova.
O Capitão Hynes sabia que desastres imprevisíveis estavam sempre presentes em nevoeiros e temporais. Numa manhã, pegou no leme pouco após a alvorada e fez-se a um mar tremendo, com ondas batidas por ventos na ordem dos 80-90 nós. O “Adventure” seguiu firme, com o motor a manter o rumo à medida que subia e tombava nas vagas. De repente alguém gritou. Uma onda monstruosa, subindo sobre as outras, quebrou sobre a embarcação. Por instinto, todos os homens se agarraram a algo e quando a onda quebrou no convés, engoliu os homens ao leme e levou-os no caldeirão de espuma.
O Capitão emergiu do dilúvio a 15 metros do leme. Olhou de imediato para ele e horrorizado viu que o leme tinha desaparecido. Correu gritando ordens à tripulação que caía no convés. Os destroços da casa do piloto com dois dos seus ocupantes eram levados pelo mar. Hynes debateu-se para voltar o barco – manobra quase impossível em tamanha tempestade. Por alturas em que conseguiram aproximar-se dos destoços, um homem já não estava lá. Lançaram uma corda ao outro e falharam e de novo tentaram. Com demasiado frio e talvez ferido, ele estava fraco demais para se segurar. Camaradas ensopados olhavam desamparados do convés. O “Adventure” regressou solenemente a Boston, mais uma vez com bandeira a meia-haste. Aquela terrivel visão assombrou o Capitão Hynes que décadas mais tarde ainda dizia que sonhava com aquilo.
Nos inícios dos anos 50, novos métodos de pesca e uma tripulação envelhecida abriram o último capítulo na vida do “Adventure” como o campeão da frota de Gloucester, pois arrastões começaram a substituir a mais arriscada pesca de dóris. O fim da sua carreira de pesca foi em 1953, quando era a última escuna de pesca com dóris Americana no Atlântico. Marcou o fim de uma era de grandes embarcações e homens destemidos que vinham ainda rapazes da Nova Escócia, Terra Nova, Escandinávia, Portugal e Nova Inglaterra para pescarem durante todas as suas vidas na costa nordeste. Foi uma era rica em imagens visuais, de desafio e tragédia, de humilde coragem de homens que largavam trol de um barco pequenino a 200 milhas no mar – e de famílias que aguardavam pelos seus entes queridos de regresso a casa.
Em 1954 uma sociedade comprou o “Adventure” por 6.000 dólares, retirou-lhe o motor e as anteparas, contruíu camarotes no porão do peixe e puseram-no a velejar até Rockland, Maine sob o comando do Capitão Dayton Newton. Durante a próxima década, o “Adventure” transportaria pessoas em cruzeiros de Verão nas águas ao largo do Maine.
O Capitão Jim Sharp comprou-o em 1965, reparou-o e com aparelho de escuna totalmente original pô-lo ao serviço em Camden, Maine em 1966, velejando de novo em cruzeiros na zona durante os próximos 23 anos ficando conhecido como o “Rei dos Veleiros”. Em 1977 participou na versão para televisão do filme “Os Corajosos do Capitão”. Em 1988, o Capitão Sharp doou-o à cidade de Gloucester, com a condição de que fosse mantido e cuidado e exibido como monumento de Gloucester, sendo usado na educação e prazer do seu público. A Gloucester Adventure Inc., corporação sem fins lucrativos, foi criada para restaurar a escuna e providenciar programas educativos para a comunidade de Cape Ann em 1988. Todo o seu pessoal e tripulação é composto por voluntários que se prestam a preservar o navio para a posteridade, a servir a comunidade de todas as idades e a operar a embarcação como símbolo da herança marítima Americana.
Nos dois anos seguintes passou a incorporar uma Direccão e a contratar pessoal com a função de desenvolver programas e angariar fundos necessários ao restauro do navio na sua forma original.
A escuna de pesca de Gloucester “Adventure” com 70 anos, é um monumento nacional desde 1994.
Texto traduzido do original em archives.obs-us.com/obs/adventure.
 
A história desta escuna de pesca é um perfeito exemplo do que pode ser feito com velhas embarcações e como já referi antes, associá-las a instituições ou grupos de interessados. Com o devido trabalho, é possível dar-lhes a vida que tinham no passado e não faltarão nunca voluntários que queiram participar, pois uma passagem a bordo de um barco como membro da tripulação é bem vista por gente de todas as idades. O histórico lugre bacalhoeiro “Hortense” poderia ser um “Adventure” em Portugal, mas acabou por arder no Mar da Palha em Lisboa... .
 
Site oficial do “Adventure” (em Inglês).
Um par de fotos.


publicado por cachinare às 11:48
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1 comentário:
De jaime pontes a 6 de Fevereiro de 2009 às 20:23
Adventury éra o nome dado a esta escuna !.Mas que história tém este navio? coisas boas e outras menos boas ,se não vejamos ,éra o campião de pésca ! más de certa maneira ,perde o seu Capitão ! depois émbarca outro capitão ,um homem novo trinta e tres anos,com muitos conhecimentos ,más que não foi feliz ? Más o Adventure lá se aguentou até os setenta anos de vida ,é o que se diz longa vida . Vou contar uma história que se passou com o meu barco o Caximar ! Travalhava-mos nos mares de Aveiro mais concretamente nos camações pesqueiro a oeste de Mira ,e durante sete anos fizemos vida ém aveiro ,aos fins de semana o barco ficava ém São Jacinto . Um bélo dia no fim da pesca navegamos rumo Aveiro como de costume ,éra já noite quando chegamos próximo a barra ,entretanto eu vinha em sima ao leme ,e atento aos comunicados ,o mar tinha ondulação mais ó menos forte ,e os arrastões davam fracas informações de mar na barra enquanto dia ,más que de noite seria pior ,ainda prá mais a maré descia o que éra mau. Que teimoso eu fui ? Chamei o pessoal prá sima e preparei-me prá entrar ! Entretanto um dos mais velhos chamou-me a atenção e disse-me ,cuidado Jaime que o mar é muito ? Eu não contei nada a rapaziada daquilo que sabia sobre os comunicados!, E como queria poupar oito horas ida a leixões lá e cá ,meti proa a barra ! Um homém de cada lado do barco éra noite cerrada ,estáva-mos em dezembro ,aproximamo-nos da barra e ,na altura que estáva- mos em sima da barra com a sonda aberta eu gritei pró pessoal é agora? Então agarrado ao leme ,olhei para os homéns e vi os a gaguejar ! não éra prá menos ,porque eu olhei pela janela e vi uma grande onda a popa ,só tive tempo de engatar a maquina a ré a toda força e a onda que éra enorme da-nos na popa e o barco põe a proa debaixo de água e encarrilha ,eu nunca mais aguentei o leme ,que parecia um helice em rotação ,o barco foi a meter o bombordo debaixo de agua a querer virar ,más graças a deus a força do mar deixou-nos dentro ,eu perguntei está tudo bém ? um só me respondeu sim Jaime más dá força que vém mar ,eu respondi ,não há problema que o mar aqui não chega ,sim a sonda estava ,com cinco braças ,o leme estava bém ,portanto foi alar as bandas que correram borda fora ,mas como estavam amarradas as pontas aos mastros foi do lado bombordo que correu borda fora ,foram também varias caixas de peixe levado más graças a Deus não aconteçeu o pior que diga-se não escapava ninguém prá contar como foi ? Trinta anos a governar ,sete viagéns de bacalhau cinco anos ém moçambique que também não foi facil com varios naufragios em duas traineiras ,dois navios bacalhoeiros e um barquinho da pésca artezanal portanto cinco naufragios e o maior susto foi precisamente na barra de Aveiro que não só essa vês más com deus estámos cá para contar estas crueis histórias porque o mar não tém pena de ninguém ,e dirá alguém ? más tú abosaste do mar ! Sim ,más o mar é para os homéns do mar e por aqui me fico ,sem mais um abraço e Saúdações Maritimas ...Jaime Pontes...


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