Matosinhos - O Grande Naufrágio de 1947.
«O dia 1 de Dezembro de 1947 nasceu encoberto e sombrio embora não chovesse nem houvesse grande vento. As traineiras começaram a chegar mas o peixe que traziam era escasso. A meio da manhã, no entanto, entra em Leixões uma traineira carregada de sardinha. Os mestres das embarcações, perspectivando sucesso, decidiram então chamar as suas tripulações e mandar aprovisionar os seus barcos para outra saída.
Durante a tarde, com bom tempo, saíram de Leixões 103 traineiras para a faina. Rumaram a Sul, em direcção ao mar da Figueira da Foz.
Passadas algumas horas, subitamente, o tempo muda. As embarcações vêem-se envolvidas num imenso temporal. As ondas cavam abismos no mar e elevam-se, qual montanhas, ameaçando destruir a frota. O vento roda para NW e o ar arrefece cada vez mais. Cai a noite, escura, sem lua visível. Nuvens carregadas de chuva tapam o céu. Os ventos manifestam-se em rajadas ciclónicas. O mar brame cavernosamente, como que exigindo o sacrifício de inocentes. Os motores e máquinas das traineiras são esforçados ao máximo, em busca de porto de abrigo.
Já noite, com a luz da manhã ainda longe, em terra, sentem-se murmúrios, soluços incontidos, pessoas a correr em direcção ao areal da praia nova, em Matosinhos. São as mulheres e os filhos, os pais, a família em busca dos seus. Sabiam que algo ia mal. Era grande a angústia e o desespero.
Na cabeça do molhe sul do porto de Leixões as pessoas apinham-se na esperança de ver entrar as traineiras. Ao longe vislumbram-se luzes de navegação; eram barcos que procuram conseguir encontrar um caminho para chegar a bom porto.
Começam a chegar, com muitas dificuldades, as primeiras traineiras que se conseguem salvar. As notícias não são boas.
Foram avistadas 4 traineiras a navegar muito perto da costa, entre a Aguda e o Senhor da Pedra (Vila Nova de Gaia), em situação aflitiva. Eram a “D.Manuel”, a “Rosa Faustino”, a “São Salvador” e a “Maria Miguel”. Alguns mestres de traineiras, com as suas sirenes, com sinais, até com gritos, tentaram orientá-los para conseguirem sair daquele perigoso local, mas a violência do temporal impediu-os de serem bem sucedidos.
O ambiente estava envolto num pesado e sinistro luto. As pessoas gritam sem se verem umas às outras, e correm, desnorteadas, de um lado para outro, sem objectivo definido.
Decorrido algum tempo chegam as fatídicas notícias: as 4 traineiras em dificuldade naufragaram. Em outras, homens caíram ao mar, desaparecendo para sempre.
Faleceram 152 tripulantes.
Pais, filhos, irmãos foram assim subtraídos à sua família, levando a dor e a desolação a centenas de lares humildes de pescadores, deixando 71 viúvas e 152 órfãos.
O luto instalou-se em Matosinhos, em Espinho, na Murtosa, na Póvoa de Varzim e em Vila do Conde.»
Por Nuno Marques Garrido – MarForum, 21 de Maio de 2007.
«Assinalando 60 anos passados sobre a trágica madrugada de 1 para 2 de Dezembro de 1947 vai a Câmara Municipal de Matosinhos e a Junta de Freguesia proceder ao lançamento de um livro, na Capela de Santo Amaro, da autoria do Prof. A. Cunha e Silva e de Belmiro Galego, no próximo dia 2 de Dezembro pelas 10horas da manhã. Este livro é o fruto de uma aturada investigação de um Leceiro e de um Matosinhense, dedicados à sua terra, à sua gente e ao seu património; que percorrendo várias bibliotecas e inúmeros jornais e revistas coligiram e dão a conhecer, os relatos feitos na época dessa medonha madrugada em que o mar tão repentinamente se levantou e levou 152 pescadores, que no regresso da sua faina já não chegaram ao seio dos seus familiares que, como de costume, os esperavam na praia. Foi na realidade uma negra e sinistra madrugada essa a de 2 de Dezembro de 1947, em que naufragaram entre Aguda e Leixões quatro traineiras: a “D. Manuel”, a “S. Salvador”, a “Maria Miguel” e a “Rosa Faustino”, tendo perecido 152 homens sem a menor hipótese de que alguém lhes valesse.
As traineiras da praça de Matosinhos haviam saído para o mar, como habitualmente, às dezenas, apesar de haver vários prenúncios de temporal, pois para os pescadores o espectro da fome sempre se sobrepôs ao medo e sempre fez com que esses valentes e ousados lobos do mar galgassem as ondas saindo a barra, para quantas vezes não mais voltarem!
Há casos fantásticos, como o daqueles três homens que no reboliço da traineira “D. Manuel”, com o espectro da morte à sua frente, foram arrojados à praia do Cabedelo, procurando ajuda numa das pobres casas aí existentes; ou aqueles dois outros que depois de terem sido roubados de bordo com outros dois camaradas, foram de novo lançados para dentro da traineira, e um dos que o mar não devolveu, mantendo-se agarrado a uma tábua, teve a sorte de por ele passar uma traineira que lhe lançou uma bóia, a qual enfiando-se-lhe milagrosamente pela cabeça, o salvou, ou ainda aquele outro que a bordo da traineira “Rosa Faustino”, passando com terra à vista, se lançou ao mar nadando até à exaustão sendo recolhido das ondas, salvando-se com outros dois arrojados à praia pelo mar!
Deste modo, de quatro companhas das quatro traineiras afundadas, apenas se salvaram seis camaradas em tão horrorosa tragédia marítima que enlutou não só a costa nortenha mas praticamente toda, de norte a sul, não havendo memória de catástrofe maior, a qual, para além daqueles que levou, deixou também muitas viúvas e órfãos mergulhados na dor e na desolação.
O livro “O Naufrágio de 1947” será assim um elevado preito de homenagem da Câmara Municipal, da Junta de Freguesia, dos autores, mas não só, pois será também o reconhecimento por todos aqueles que assistirem ao lançamento, que recordarão muitos daqueles que se sacrificaram pela elevação e desenvolvimento desta nobre cidade de Matosinhos – Leça.»
Eng.º Rocha dos Santos
Esta obra intitulada “Naufrágio de 1947 – Toda a Saudade é um Cais de Pedra”, já editada há cerca de ano e meio, é um dos melhores exemplos à memória de quem sofreu com esta tragédia até aos dias de hoje. Este foi o maior naufrágio de que os pescadores têm memória, o qual marcaria a vida dos pescadores e das comunidades piscatórias de todo o país, em especial do Norte. A sua aquisição é quase óbvia para quem se interessa pelo mar e por quem teimosamente nele se mete... merecendo sempre a nossa admiração e estatuto superior ao que têm hoje.
Este naufrágio ficou na memória pelo terrível número de homens que pereceram, tal como o também conhecido naufrágio à entrada da Póvoa de Varzim em 27 de Fevereiro de 1892, perecendo 105 pescadores em 8 embarcações. No entanto, poderia encher-se uma biblioteca inteira com as centenas de naufrágios de que já ninguém fala. São em especial esses “esquecidos” que mais merecem investigação e memória representativa, no imenso universo piscatório.
Meu deus como me lembro de correr as 4 da manhã pela mão de minha irmã ela com 7 anos eu 5 aninhos ,minha mãe saiu de casa as 2 ou 3 da madrugada aos gritos ,aliás já era tudo uma gritaria nas ruas de Matosinhos , mas para alem das mulheres também crianças aos gritos porque as mães levavam os filhos agarrados as saias ,e era um horror foi noite e dias o pessoal aos gritos ,por isso me ficou na retina esse malogrado dia aliás noite e dia .
Que desgraça meu Deus tenho o livro e não consigo ler até o fim ,pois que esse drama maritimo é de arrepiar mesmo passados 60 anos ,porque quem vive do mar ainda hoje chora ao lembrar-se ou ler esse horroroso e nefasto dia foi duro esses tempos que ficou na história como dos mais horrorosos naufrágios Portugueses !!!
cumprimentos Jaime Pião ...
De Celestino a 2 de Dezembro de 2009 às 23:22
Olá, caro Jaime!
Também um tio meu esteve nessa tragédia. Felizmente salvou-se.
Um abraço,
Celestino
Boa tarde amigo Celestino e todos que aqui passem .
Sim essa foto retrata bem esse grande naufrágio que foi um horror nesse tempo !
Meu pai andava na Maria do Alívio com o mestre Zé da São Benta e chegou cedo a terra isto aí pelas 2 horas da madrugada ,mas o comandante da capitania pediu as traineiras que chegaram mais cedo ,para servirem de salva vidas o que aconteceu ,por isso minha mãe e muitas mulheres gritavam por tudo que era cais e praia ,e minha mãe que andava em estado de gravidez perdeu o filho e a partir dai nunca mais vingou um filho no seu ventre tudo pelos problemas causados de andar aos gritos na praia nova de Matosinhos e ver corpos a praia que iam aparecendo e, sem saber que o meu pai já tinha chegado, só soube quando chegou o dia e foi assim que muitas pessoas ficaram traumatizadas e viveram os seus dias em soluços constantes, diria mesmo, dias negros nalgumas famílias desse tempo !!!
cumprimentos Jaime Pião ...
De anabela natario a 13 de Junho de 2011 às 09:48
Bom dia
Sou neta do Jose Dolmundo que faleceu neste naufragio no barco Rosa Faustino, alguem me pode dizer aonde posso comprar o livro
De anabela Natario a 13 de Junho de 2011 às 09:51
o meu e-mail: belita.nat@gmail.com
De Joaquim Lúcio Ferreira Neto a 28 de Março de 2021 às 15:22
Em relação ao seu comentário, pergunto: O nome do seu avô era Dolmundo ou Delmundo? Era o motorista da Rosa Faustino?
Grato ficaria se me prestasse essa informação.
Aguardando a sua resposta, com os melhores cumprimentos,
Ferreira Neto
De Anónimo a 4 de Dezembro de 2009 às 22:15
Nesse Ciclone de Dezembro de 1947, também meu pai lá andava.
Apesar de miudo, lembra-me de o ouvir contar, que quando algumas traineiras já vinham a fugir ao tempo, eles ainda saíam para o mar.
Pescava então, na Nª Srª Auxiliadora e andou tempos com os braços pisados, por quando da arribada, ter vindo agarrado à gaiuta, a fim de não ser levado pela borda fora.
O ano passado, estive no Salão Nobre da Câmara de Matosinhos, no lançamento do livro do Naufrágio, que
faz parte da minha biblioteca.
Quanto sei, ainda temos um sobrevivente em Vila do Conde, a quem brevemente espero ter a oportunidade de entrevistar, no âmbito da Celebração da Cultura Costeira, em boa hora patrocinada pela Mútua dos Pescadores, entre outos.
Aos que pereceram, que descansem em paz.
Albino Gomes
De Jade Phillips a 3 de Dezembro de 2015 às 00:38
Boa noite :)
O meu namorado é bisneto do Mestre Manoel Cunha Folha Malhalassa ", que encontrava na traineira S.Salvador , acompanhado pelo seu filho de 16 anos António Cunha Folha. Ele está sempre a procurar informação sobre o que aconteceu, pois sua avó é a única filha ainda viva do Mestre.
Eu gostaria de saber se alguem tem uma cópia ou sabe de alguem com uma cópia do livro que eu possa comprar, como o senhor disse que faz parte da sua coleção provavelmente sabe de como eu poderia arranjar uma cópia.
Espero pela sua resposta, obrigada
Jade Phillips
Bom dia amigo Albino e todos que por aqui passem .
Pois com respeito ao grande naufrágio de 47 onde morreram muitos homens infelizmente , do único que tinha-mos vivo desse naufrágio o José Pinheiro acabou por falecer o ano passado, salvo erro por isso se te referes ao José Pinheiro ele já não está entre nós infelizmente ,meus cumprimentos Jaime Pião ...
De Anónimo a 6 de Dezembro de 2009 às 12:40
Hoje, Domingo, o Amigo Jaime deu-me um desgosto com a notícia da morte do José Pinheiro. Era exactamente o homem em causa, ao qual apenas
me referi como Vilacondense e não especificamente Caxineiro, para não levantar a caça...
Perante esta triste notícia, ao José Pinheiro, resta-me
desejar-lhe que DESCANSE EM PAZ.
Albino Gomes
De marta pinheiro a 4 de Agosto de 2011 às 18:12
ola sou neta do jose pinheiro eu tenho 2 livros deste naufragio que eram do meu avo agora sao do meu pai
ele antes de morrer falava diso ele morreu no dia 2 de junho de 2009
De Jade Phillips a 3 de Dezembro de 2015 às 00:42
Boa noite :)
O meu namorado é bisneto do Mestre Manoel Cunha Folha Malhalassa ", que encontrava na traineira S.Salvador , acompanhado pelo seu filho de 16 anos António Cunha Folha. Ele está sempre a procurar informação sobre o que aconteceu, pois sua avó é a única filha ainda viva do Mestre.
Eu gostaria de saber se alguem tem uma cópia ou sabe de alguem com uma cópia do livro que eu possa comprar, como disse que em sua familia existem dois livros gostaria de saber se sabe de como possa arranjar uma cópia do mesmo.
Espero pela sua resposta, obrigada
Jade Phillips
De Jade Phillips a 3 de Dezembro de 2015 às 00:17
Boa noite pessoal :)
O meu namorado é bisneto do Mestre Manoel Cunha Folha Malhalassa ", que encontrava na traineira S.Salvador , acompanhado pelo seu filho de 16 anos António Cunha Folha. Ele está sempre a procurar informação sobre o que aconteceu, pois sua avó é a única filha ainda viva do Mestre. Eu gostaria de saber se existe por ai alguém que tenha uma copia do livro que possa vender, seria uma das melhores coisas que poderia oferecer a família dele. Se alguém tem um livro ou saiba de alguém com um livro que possa dispensar, obviamente irei comprar, por favor entrem em contacto comigo, obrigada.
De Claudia Santos a 1 de Abril de 2019 às 14:01
Alguém sabe onde posso adquirir este livro????
De jose Ferreira a 19 de Outubro de 2020 às 00:35
Mus Pais tinham uma pequena tasca que servia almoços em frente ao cais o que minha mãe sempre contava é que esse negócio por causa dessa tragédia nao sobreviveu porque os clientes pagavam ao final do Mês e como a maioria dos que faleceram eram clientes lá se foi a tasca
Os meus falecidos pais que eram um jovem casal de 22e 23 anos foram protagonistas nesta tragédia . Eles possuíam um pequeno restaurante que servia refeições sendo que a maior parte dos clientes eram os pescadores , com o resultado dessa tragédia uma vez que a maioria dos clientes morreram tiveram que fechar o restaurante . eu nasci 2 anos depois,
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