Segunda-feira, 2 de Outubro de 2023
Bacalhau, uma história épica.

 

«A história da pesca do bacalhau é quase a história da civilização ocidental. Para Portugal é uma história épica intimamente ligada aos descobrimentos e ao renascer da pesca no século XX.

Os antigos registos apontam como certo que os vikings aportaram à região da Bairrada durante o século IX, ainda antes da formação de Portugal. Misto de guerreiros e de comerciantes, traziam consigo bacalhau seco que trocavam por sal e vinho. Ou seja, os noruegueses antigos trouxeram para Portugal o gosto a bacalhau.

Depois da formação de Portugal, já no reinado de D. Pedro I, em 1303, há registo escrito de que um tal Afonso Martins, em representação dos pescadores bairradinos, estabeleceu acordo com o rei de Inglaterra para pescar bacalhau nas costas britânicas.

Os reis portugueses estavam preocupados com as descobertas das rotas das especiarias. Um mapa português datado de 1424 (guardado no museu Britânico) mostra que já se conheciam a Terra Nova e a Nova Escócia. Aliás os navegadores de Viana do Castelo, de que João Álvaro Fagundes é o mais conhecido, e os Corte-Real, povoadores dos Açores, baptizaram aquela «ilha» de Terra Nova dos Bacalhaus. Ou seja, a busca da Índia fê-los encontrar um outro tesouro.

O rei D. Afonso V fez um acordo com o rei Christian I da Noruega e Dinamarca para que navegadores dos dois países tentassem encontrar a falada passagem do noroeste, que daria acesso ao Oceano Pacífico, contornando a grande «ilha» da Terra Nova. Sabe-se que em 1446 essa viagem já tinha sido realizada.

A rota da Terra Nova passou a ser dominada pelos navios portugueses. A pesca era de tal modo florescente que em 1506 D. Manuel lançou um imposto sobre a pesca da Terra Nova.

Pelo meio de tudo isto há que salientar a criação de um novo método de curar peixe que passou a ser utilizado tanto pelos portugueses como pelos bascos. O peixe capturado nas costas inglesas vinha nas barcas e caravelas até às costas ibéricas. Para que não apodrecesse limpavam-no logo de vísceras e cabeças e salgavam-no no barco par o conservar, tal como se fazia com as carnes. Mas, depois de descarregado o peixe ainda escorria muito água. Daí se ter passado a secá-lo nas rochas costeiras. Assim era mais fácil de transportar, era mais durável e os comerciantes pagavam mais por este peixe bem curado.

Quando Portugal esteve sob domínio de Espanha toda a frota de pesca portuguesa foi arregimentada para fazer parte da chamada Invencível Armada, com a qual Filipe III queria vencer os ingleses. A derrota da frota ditou a queda das pescas portuguesas. Sem embarcações capazes, os portugueses só retornam aos bancos de bacalhau da Terra Nova quase dois séculos depois.

A pesca do bacalhau só ganha nova forma e força no Século XX com a aposta feita pelo Estado Novo em voltar à pesca longínqua.

Mas a pesca do fiel amigo era feita em exagero. As frotas americana, canadiana, espanhola pescavam bacalhau sem parar. Os portugueses mativeram durante muito tempo as artes de pesca tradicionais, usando a linha e os dóris para captura o fiel amigo.

Nos anos 90 acaba-se a pesca do bacalhau na Terra Nova. Os cardumes estavam á beira do esgotamento. A frota portuguesa, por utilizar métodos de pesca antiquados (pesca à linha) por comparação com a maior parte dos outros navios de pesca, acabou por ser a menos responsável no esgotamento dos stocks. Passados mais de 15 anos, a pesca de bacalhau naquela área, os cardumes de bacalhau ainda não voltaram a atingir um nível sustentável.

Agora, em Portugal, de novo, é dos mares frios do Norte da Europa, tal como nos primórdios da nossa nacionalidade que nos voltou a chegar o nosso fiel bacalhau.»

 

in Mar da Noruega

foto - lugre bacalhoeiro português "Gaspar", em 1947.



publicado por cachinare às 08:39
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