Quarta-feira, 22 de Agosto de 2018
Lanchas volanteiras - 1880
Para um aficionado da arquitectura naval dos antigos barcos de pesca portugueses, especialmente dos da minha terra, Poça da Barca / Póvoa de Varzim, esta foto encontrada há tempos é uma das mais extraordinárias que jamais vi sobre o tema.
Mostra-nos a ribeira da comunidade piscatória de A Guarda, na Galiza, situada perto da fronteira com o rio Minho. O ano indicado é o de 1880, sendo pois a imagem mais antiga que conheço onde se vêem barcos de pesca da tipologia “poveira”. A Guarda tem um antigo historial de contacto com a Póvoa e sua gente que lá rumava todo os anos em pregrinação e era comum antigamente o casamento entre galegos e nortenhos,
Estas lanchas na foto eram as famosas “volanteiras”, bem conhecidas também por Caminha, Gontinhães ou Viana do Castelo e nota-se ainda nalgumas detalhes de uso do 2.º mastro. Embora practicamente não seja referido hoje em dia quando se fala do “barco poveiro”, houve tempos em que estes barcos armavam 2 mastros, nomeadamente os de maior porte. Nota-se na foto também a não existência dos “corredores” laterais e as proas um pouco menos lançadas que nos barcos portugueses.
Esta foto faz parte de um grande espólio disponível na internet sobre a Memória do Mar da Galiza, cujo link está abaixo. Vale a pena a visita.
Quinta-feira, 9 de Novembro de 2017
A Gamela de A Guarda – Galiza.
A Gamela de A Guarda na Galiza, é uma das embarcações mais antigas que se conhece nesta região das Rias Baixas, sendo provavelmente o barco de mais fácil construção e menor custo na vertente tradicional. De tamanho considerável e formas primitivas, destaca-se a facilidade com que é varada para o areal ou puxada para o mar. Compreendendo cerca de 5 metros de comprimento e boca de 2 metros, eram construídas inteiramente em madeira de pinho, a qual na actualidade foi substituída pelo contraplacado marítimo. Sem cavernas, incluem 3 bancos e carlinga para o mastro, chamaceiras para até 6 remos e vela do tipo bastarda ou poveira.
Tradicionalmente, eram pintadas com uma mistura de 14 quilos de breu, 2 de alcatrão, 1 litro de óleo de sardinha e 2 quilos de polvo vermelho. Dando-se a mistura por dentro e por fora da embarcação, esta era a receita da antiga querena, sendo por isso o tom geral da mesma o vermelho que é possível ver nas fotos.
Nos tempos actuais, são pintadas de diversas cores e outros desenhos, perdendo-se deste modo as marcas tradicionais que se usavam nas suas popas. Usando agora um motor fora-de-borda que substituíu as velas e os remos, os pescadores actuais usam também um alador para facilitar o puxar das redes, o qual varia conforme a época e tipo de faina.
Esta embarcação restringe-se quase exclusivamente à comunidade de A Guarda.
Segunda-feira, 27 de Abril de 2015
O bote polveiro – Galiza.
«Junto com a dorna, a gamela, a lancha de relinga e outras embarcações, o bote polveiro é um dos barcos tradicionais emblemáticos da costa da Galiza. O bote polveiro de Bueu é uma embarcação muito estável, forte e pesada, de casco redondo, a boca é metade do seu comprimento, baseando-se a sua morfologia, segundo S. Morling, na lancha de relinga. Representa pois bem o que eram as embarcações antigas daquela zona da Galiza. O seu comprimento ronda os quatro metros, é coberto em cerca de 1/3 e quase todos têm um viveiro ao centro. Também se faziam uns mais pequenos de três metros e meio e outros maiores que chegavam aos cinco metros e meio.
Existem registos que atestam a grande importância da apanha do polvo na Ría de Pontevedra desde meados do século XVI até meados do século XVIII, regulando-se as épocas de venda e as artes permitidas, demonstrando este bote total superioridade nas águas rochosas da ria.
Construía-se em madeira de carvalho (quilha, roda de proa, cadaste e cavernas) e pinho para o forro, bancos, cobertas e mastro. Os remos são como os da dorna, de duas peças e que se cruzam ao remar.»
via Modelismo Naval
O pequeno documentário acima mostra-nos o bote polveiro da Associação Amigos das Embarcacións Tradicionais "Os Galos", de Bueu. O seu presidente, Victor M. Domínguez Antas, mostra-nos na 1.ª pessoa o manobrar deste bote, quer a remos, quer à vela.
E as nossas catraias das Caxinas e Favita... onde andam?
Quinta-feira, 28 de Agosto de 2014
A Gamela de Coruxo - Galiza.
A Gamela da comunidade de Coruxo, região de Vigo, é considerada uma evolução da gamela de La Guardia. Sendo um barco barato e de fácil construção, a maioria das gamelas da Galiza são do tipo de Coruxo, de estrutura também simples mas mais reforçada com os corredores a toda a volta. Tal permitiu que se pudesse utilizar madeiras de menor espessura e com isso dar mais ligeireza à embarcação. As suas dimensões variam, mas nunca chegam aos cerca de 5 metros das de La Guardia.
São também construídas na sua totalidade em madeira de pinho e o seu pouco calado facilita bastante a navegação nas zonas rochosas junto à costa, sendo utilizada maioritáriamente dentro das Rias Baixas.
Para ancorar, muitas continuam a utilizar a tradicional poita (poutada em Galego) visível na foto, uma grande pedra presa numa armação de madeira, um dos elementos marítimos mais emblemáticos na faina antiga também por exemplo na Póvoa de Varzim, entre outras comunidades e seus barcos. Os antigos toletes em madeira para a chamada dos remos são hoje em aço inoxidável.
O uso nos últimos anos destes barcos (entre outros) para a vertente de vela lúdica, ajudou também a que se mantivessem no activo, pois a pesca moderna serve-se de diferentes e mais produtivos meios no dia-a-dia. Com isso mantém-se a sua construção tradicional ainda levada a cabo por experientes mestres de carpintaria de ribeira.
Hoje em dia já se começam a ver algumas revestidas a poliester, mas nunca na sua totalidade, como já ocorre com outras embarcações do Cantábrico e Mediterrâneo e os motores fora-de-borda farão com que continuem a ser usadas em pleno século XXI.
Existe também uma gamela com proa e popa quadradas de pequenas dimensões que se usa como auxiliar dos barcos maiores.
Segunda-feira, 8 de Março de 2010
A Galiza não pára.
«A asociación Mar de San Ciprián pretende “recuperar unha tradición perdida hai case un século na comarca de A Mariña” para o que construirá unha embarcación traiñón “segundo a tradición construtiva acumulada durante décadas nos estaleiros sancibrenses”, aseguran desde a asociación.
A asociación “Mar de San Ciprián” deu comezo ao desenvolvemento dun proxecto constructivo que os levará a dispor dunha embarcación tipo “traiñón”. Este barco será construído en madeira segundo a tradición constructiva acumulada durante décadas nos estaleiros sancibrenses. Neste caso, será Francisco Frá, derradeiro carpinteiro de ribeira en activo nesta comarca, o encargado da súa construcción.
Francisco Frá xa comezou o deseño e elaboración desta embarcación co trazado do deseño básico e a formulación da montea. Así mesmo, xa dispón da maqueta, coa que deu trazado ás liñas que servirán para enxergar as cadernas da nave. Estes traballos deron comezo grazas a axuda económica recibida desde á Área de Cultura da Deputación Provincial de Lugo, e que ascendeu a 2.525 euros.
Esta embarcación estará construída en madeira de carballo e pino do país, ao entender que estas madeiras recuperan a verdadeira fórmula constructiva autóctona e se adaptan de forma plena á recuperación etnográfica de embarcacións típicas que este Concello quere facer mediante esta actuación. Do mesmo xeito, tamén se empregará o lenzo para a confección das velas, así como o sisal e a abacá para os cabos e aparellos do velame.
Para tal fin tamén se recuperarán as formas constructivas propias desta embarcación, xa que se dotará dunha proa rodada e fina para favorecer as manobras, ao xeito das antigas, e se lle dará maior forma a popa, co gallo de recuperar a forma denominada chea, con motivo de dotar á embarcación de máis arqueo á popa, debido ao peso do aparello que lle da nome á lancha.
As dimensións da embarcación serán 10 metros de eslora, 2,40 metros de manga e 1,10 metros de puntal. Asemade, e para recuperar de xeito fidedigno esta tipoloxía de embarcación, a nave estará propulsada por dez remos, cinco por banda, aos que se engadirán dous paos – mastros con velas ao tercio, sendo a de popa de maior tamaño. Tamén se construirá un temón de maior puntal que a lancha, de forma que axude ás manobras, correspondendo o goberno a un décimo primeiro remo no caso de navegación mediante boga.
A asociación “Mar de San Ciprián” ten entre os seus obxectivos a conservación e recuperación do patrimonio marítimo mariñao en xeral e sancibrense en particular. Entre outras citas e iniciativas, levan xa representado o patrimonio marítimo – pesqueiro mariñao nos VII e IX Encontros de Embarcacións Tradicionais de Galicia, celebrados en Ferrol e Muros nos anos 2007 e 2009.
Desde a asociación sancibrense queren agradecer publicamente a achega concedida desde a entidade provincial, e agardan contar co apoio doutras administracións para conseguir avanzar as diversas fases constructivas que a embarcación agora iniciada.»
Desta vez é no Norte da Galiza que se mete mãos-à-obra e mais um novo (e já desaparecido) barco tradicional vai nascer. Continua o seu povo com muita vontade de trabalhar neste campo cultural, mas também o apoio das autoridades “dá uma mãozinha”, sempre importante.
Aprendamos.
Quinta-feira, 7 de Janeiro de 2010
Barcos Tradicionais - Taxas portuárias 90% mais baratas.
“Portos de Galicia reduce un 90% as taxas para embarcacións tradicionais.
Como xa anunciara recentemente,
Portos de Galicia rebaixa as taxas para as embarcacións tradicionais. Onte 30 de decembro publicouse no DOG a
Lei de Orzamentos de Galicia para o 2010 que modifica a Lei 6/2003 de Taxas, etc. introducindo unha bonificación das taxas portuarias para as embarcacións tradicionais do 90%. Transcribimos a redacción final do artigo:
e) ´Nas concesións ou autorizacións de dominio público portuario outorgadas a entidades náuticas ou culturais sen ánimo de lucro para actividades de ensinanza da náutica deportiva ou de conservación ou recuperación de embarcacións tradicionais terá unha bonificación do 90% no que se refire exclusivamente a estas actividades, sempre que non sexan obxecto de explotación económica´.
Esta é unha excelente noticia pola que levamos traballando e agardando moito tempo.”
Comentário - , 01/01/2010 - 14:17.
Felicidades. Este año ha de ser, de una vez por todas, el año en el que las embarcaciones tradicionales tengan por fin el reconocimiento debido y el apoyo legal que merecen. No peco de exagerado, ni mucho menos, si os digo que este paso que habéis conseguido en Galicia es un paso histórico. El primero del año y que os ha costado años conseguirlo. Pero el primero, y estoy convencido que no será el único. Gracias a todos vosotros por tantos años de trabajo.
Josep-Anton
Comentário - , 03/01/2010 - 14:12.
Parabéns!
No entanto, acho que para além deste primeiro passo, agora dado pelas autoridades marítimas, deveriam era dar um outro (talvez na mesma percentagem de 90%), como subsídio a quantos com as suas Tradicionais Embarcações, preservam todo o magnífico património desse povo marinheiro.
Viva a Cultura Costeira
Albino Gomes
Vila do Conde
Cometo a ousadia de transcrever o artigo recente da Federação
Galega pela Cultura Marítima e Fluvial, pois a batalha por eles ganha neste aspecto merece-o. É a partir de agora 90% mais barato ter um barco tradicional na Galiza, em taxas portuárias. Relembro por exemplo que (ao que sei), se eu pretender ter uma típica catraia poveira, até 6 metros de comprimento, amarrada na marina da Póvoa de Varzim, terei de pagar 575 Euros por ano. 90% mais barato seriam apenas 57,50 Euros/ano. Tendo a lancha do alto “Fé em Deus” cerca de 12 metros... pagará actualmente 2.100 Euros/ano, suponho. Esta diferença significa muito quando alguém decide mandar construír um barco típico da sua terra, o qual promove e muito a sua comunidade, directa ou indirectamente, algo que os munícipios teimam em não perceber e apoiar.
A Galiza continua a lutar e a ultrapassar dificuldades no reavivar da sua Cultura Costeira, mas o Norte de Portugal, antigo Sul da região galaica, de igual cultura e língua, não lhe segue o exemplo. Que a nova catraia em construção em Vila do Conde já aqui noticiada e revelada pelo amigo Albino Gomes (autor do 2.º comentário), ajude mais um bocadinho a abrir os olhos de população e autarquias, mas muito poucos são os “remadores” que vamos tendo.
E já agora, venham notícias da catraia.
Quarta-feira, 13 de Maio de 2009
Dorna de tope “Lavanqueira” – Galiza
O estaleiro Mougán, na Ilha de Arousa, Galiza, foi o local escolhido para a cerimónia do bota-abaixo da nova dorna de tope “Lavanqueira”, no passado sábado, dia 9 de Maio. É uma embarcação que que faz parte do projecto “Desafio a tope”, posto em marcha pela Federação Galega pela Cultura Marítima e Fluvial – FGCMF para tratar da recuperação deste tipo de embarcação que praticamente havia desaparecido das costas da Galiza. O seu intuito é a dinamização sócio-cultural e recuperação da dorna de tope, de forma similar à dorna “polbeira”, embora noutro tipo de construção e maior capacidade de carga. A referência principal deste projecto está no esforço das tripulções de antigamente, que competiam entre si na velocidade dos seus barcos de modo a chegarem primeiro ao porto para obterem melhores preços pelo peixe capturado.
A construção da embarcação foi impulsionada pela
Associação Fasquía, que após 4 anos, vê materializadas as suas expectativas em contar com mais dornas de tope. Esta é a segunda embarcação com estas características que se constrói na Ilha de Arousa, depois da “Peza de Rabo”, que pertence à
Associação Cultural e Desportiva Dorna. Está programada a construção de outras dornas de tope exactamente iguais a estas duas construídas, de modo a realizar regatas de competição entre as várias associações Galegas. Além disso, existe o seu grande potencial como barco-escola, actividades complementares de estudo e divulgação etnográfica.
A recuperação e construção deste tipo de embarcações traz e devolve também valor ao trabalho das carpintarias de ribeira, um sector que se encontra em franco retrocesso e em risco de desaparecer, devido à chegada de outros materiais diferentes da madeira, como o poliéster e o aço ou alumínio.
A “Lavanqueira” tem 7,27 m de comprimento, boca de 2,46 m e 1,28 m de pontal, foi construída em madeira de pinho e carvalho e armará vela de relinga. O seu bota-abaixo abre a nova temporada de navegação tradicional na região da Galiza. Este ano o maior evento será o Encontro de Embarcações Tradicionais na vila de Muros, em Julho próximo.
Mas que gosto enorme dá, ver a contínua vivacidade e trabalho realizado na Galiza com os seus barcos tradicionais. As condições das suas costas recortadas favorecem esta recuperação dos seus barcos, mas acima de tudo está a vontade e o trabalho, algo muito menos evidente no Norte de Portugal. Ainda assim, há quem esteja a lutar para que isso mude.
Vamos indo e vamos vendo.
Quarta-feira, 4 de Março de 2009
Muros, sede do IX Encontro de Embarcações Tradicionais da Galiza, 2009.
A Federação Galega pela Cultura Marítima e Fluvial (FGCMF) em assembleia celebrada a 11 de Outubro passado em Cambados, deu a conhecer a sede onde se realizará o IX Encontro de Embarcações Tradicionais da Galiza. Competiram duas candidaturas, com excelente oferta organizativa e de conteúdo: a “Mar de Muros”, “Canle de Lira”, “Esteirana” e “Mar de Noia” juntas propondo Muros, e a “Associação Marítima de Vilaxoán” com a “Associação Rompetimóns de Carril” propondo Vilagarcia para local do encontro. Ambas as candidaturas tinham o aval dos respectivos concelhos bem como diferentes agentes sócio-culturais.
Para a Direcção da FGCMF, esta dupla candidatura causou, por um lado, uma imensa satisfação por se constatar o grande grau de envolvimento do movimento associativo de recuperação da cultura marítima e fluvial em duas comarcas e por outro, a dificuldade em eleger um dos excelentes projectos apresentados. A escolha de Muros, irá sem dúvida contribuír para aumentar o movimento associativo na ria local e muito possivelmente na zona da Costa da Morte vizinha.
O Encontro de Embarcações Tradicionais da Galiza, que tem como principal finalidade a promoção e valorização do rico e variado património marítimo-fluvial galego e do norte de Portugal, é convocado a cada 2 anos pela FGCMF. O primeiro celebrou-se em Ribeira (1993) e os seguintes em Coruxo, Vigo (1995), O Grove (1997), Rianxo (1999), Poio (2001), Ilha de Arousa (2003), Cambados (2005) e Ferrol (2007). Se no de Ribeira estiveram presentes 24 pequenas embarcações tradicionais, no de Ferrol eram já 175 da mais diversa tipologia, mais de 1.000 tripulantes da Galiza, Portugal, Euskadi (País Basco), Irlanda, Açores e litoral mediterrâneo espanhol.
Actualmente a FGCMF é constítuída por 42 entidades de vários tipos (culturais, desportivas, profissionais, etc), sendo a última a “Associação de Engenheiros Navais da Galiza) e outras aguardam a integração.
Na assembleia também se realizou a retrospectiva do que foi desenvolvido em 2008. O mais relevante foi a participação em Julho na Festa Marítima Internacional celebrada em Brest, as “olimpíadas” da cultura marítima que desde 1992 se celebram nesta cidade da Bretanha. Este ano estiveram presentes cerca de 1 milhão de visitantes, 2.000 embarcações de 30 países e 800 jornalistas vindos de todo o mundo. A Galiza foi uma das convidadas de honra levando uma delegação de 150 pessoas, deles mais de 90 tripulantes para as 25 embarcações tradicionais galegas montando-se também uma exposição sobre os barcos galegos, a “village galicien”, vista por milhares de pessoas.
Adaptado do artigo da FGCMF.
Pelas fotos notam-se as excelentes condições naturais que a Galiza tem para a realização destes encontros. Já lá estive algumas vezes e é sem dúvida uma região abençoada pela beleza das suas costas “ultra recortadas”, com praias de ondulação calma e muito a descobrir. Muros é apenas uma de muitas e variadas povoações piscatórias e por certo o sucesso do Encontro 2009 baterá os números do Ferrol 2007. A quem gostar de barcos, mar, peixe, convívio e tradição Celta, aconselho vivamente a visita ao evento e à região. Os barcos agradecem.
Sexta-feira, 14 de Novembro de 2008
FGCMF - Federación Galega pola Cultura Marítima e Fluvial.
«Com a celebração de um encontro de embarcações tradicionais no Verão de 1993 nas águas de Ribeira, na costa noroeste da Ria de Arousa, começou de facto a travessia da Federação Galega pela Cultura Marítima, ainda que a sua existência legal seja de finais de 1994. Desde a criação, a sua sede encontra-se na costa leste da mesma ria, em Cambados, vila pioneira no associativismo do mar e onde se fundou em 1917 o primeiro Centro de Marinheiros e Mariscadoras de todo o Estado espanhol.
Dionísio Pereira, primeiro presidente da Federação, tem escrito sobre os sonhos e o entusiasmo da gente das três associações da altura da fundação que ininterruptamente formaram parte deste organismo (“
Dorna Meca”, do Grove, “
Etnográfico Mascato”, de Cambados e “
Cofradía da Dorna”, de Ribeira) e das associações que participaram no processo constitutivo, mas que desapareceram ou não se integraram.
Com o constante apoio de pessoas alheias à Federação – particularmente a de Staffan Mörling, o sueco de Beluso que dignificou os barcos dos pobres e a de Lino Lema, que desde a Consellería de Pesca da Xunta de Galicia sempre apoiou o movimento associativo de recuperação das embarcações e da cultura marítima tradicional – com muito voluntariado e com muito amor à navegação e a um património muito pouco valorizado, a tripulação das associações pioneiras foi quem foi contagiando o seu entusiasmo a muita outra gente do litoral galego (e do norte de Portugal), embarcando na travessia de revitalizar e dar valor a um património marítimo numa situação tão crítica em inícios dos anos 90, que tal como disse Xavier Trepat “até os mais optimistas eram pessimistas”.
Depois de um encontro de embarcações nas águas do Grove em Julho de 1997, a Federação, em palavras de Dionísio “ficou em terra, sem directivas nem actividade nenhuma”, enquanto as associações mantinham acesa a chama de dar valor a este património. No Verão de 1999, Xavier Trepat ocupou a presidência ao reorganizar-se a Federação com a integração de novas associações, salientando-se a “
Cultural Dorna”, da Ilha de Arousa, organizadora da veterana regata de dornas em volta da ilha e que já participara na fase prévia de constituição nos começos dos anos 90. Nos últimos anos, passando pela presidência de Xaquín Cuíñas e na actual de Fernando Piñeiro, icorporaram-se muitos e diversos colectivos que defendem a cultura dos mares e dos rios.
Actualmente são 38 as associações que compõem a FGCMF. Delas, 36 são da beira-mar, desde Burela nas costas da província de Lugo a Viana do Castelo, já na costa minhota portuguesa, pois a Federação é Galega da
Gallaecia; a estas juntam-se duas associações de barcas dos rios Minho e Sil, que se integraram em finais de Novembro de 2003, nos mesmos dias em que a gente da costa, desolada e impotente, via o negro petróleo do “Prestige” a invadir o meio que sempre lhes permitira viver.
A cada dois anos, no Verão, a FGCMF celebra o Encontro de Embarcações Tradicionais da Galiza, tornando-se na “Grande Festa da Cultura e do Património Marítimo e Fluvial”. O primeiro, como já dito, realizou-se em Ribeira (1993) e os seguintes em Coruxo (1995), O Grove (1997), Rianxo (1999) – este organizado pela Escola-Obradoiro de carpintaria de ribeira “A Xeiteira”, quando a Federação estava suspensa - , Poio (2001), Ilha de Arousa (2003), Cambados (2005), [[Ferrol (2007) e futuramente Muros (2009)]].
No pioneiro Encontro de Ribeira navegaram apenas duas dúzias de barcos tradicionais, enquanto que no de Cambados se inscreveram 122 barcos (cerca de 170 com os não inscritos), que vieram de todo o litoral da Galiza e também de Portugal, Euskadi (País Basco), Irlanda e litoral mediterrâneo espanhol. Nunca tantos tipos diferentes de embarcações e de velas tradicionais se viram a navegar num encontro da FGCMF e nunca tantos tripulantes velejaram juntos – inscreveram-se 755 – o que demonstra a vitalidade do património marítimo, particularmente do galego e a força de um movimento associativo socialmente ainda bem pouco visível para a maioria da população. Esteve mesmo presente uma rudimentar lancha da vindima de Chantada, das que navegavam pelo rio Minho.
Em 2007 celebrou-se no Ferrol o VIII Encontro, onde de novo se mostrou a riqueza do património marítimo e fluvial da Galiza (e de países banhados pelo Atlântico e Mediterrâneo) e a necessidade de o conservar, servindo para demonstrar as possibilidades económicas do desenvolvimento das acções sobre a cultura e o património marítimo e as vias que se podem abrir para actividades que gerem emprego, sem desgaste do meio marinho e fluvial. No Encontro da Ilha (2001), institucionalizou-se a presença de um convidado de honra, que nesse ano foi Portugal, enquanto que no de Cambados foi o Mar Mediterrâneo e no de Ferrol a Bretanha.
A FGCMF funciona em assembleia com três reuniões anuais ordinárias. Desde 2001 que conta com um boletim interno, “O Apupo”, onde se dá conta da vida associativa da Federação e que se distribúi em papel e pela internet e para substituir a publicação bi-anual que se editava desde o Encontro de Coruxo, lançou-se a “Ardentía”, revista de cultura marítima e fluvial dirigida por Luís Rei, da qual saíu o primeiro número em Junho de 2004 com o património imaterial marítimo-fluvial como tema para assim apoiar a Candidatura de “Ponte nas Ondas” das Tradições Orais Galaico-Portuguesas como Património da Humanidade. Em Março de 2007 saíu o nr. 4, dedicado à mulher marinheira, porque nos mares também trabalham mulheres.
(...) A FGCMF realizou recentemente uma exposição sobre o património marítimo e fluvial centrada nas embarcações. O objectivo foi mostrar de forma didática a rica tipologia dos barcos tradicionais, a sua evolução e uso actual bem como a diversidade de contornos socio-culturais e ambientais nos quais nascem e se desenvolvem. Esta exposição esteve no Encontro do Ferrol e em Julho de 2008 em Brest, França, na Festa das Tradições Marítimas, onde a Galiza foi convidada de honra juntando-se à Noruega, Suécia e Vietnam.
À parte de potenciar a recuperação e reabilitação de muitos e diversos barcos tradicionais por parte das associações federadas, de elaborar informação e exposições do património e de difundir o seu valor e o seu deficiente estado de conservação, a FGCMF participa nas manifestações culturais marítimo-fluviais da Península Ibérica (Portugal, Euskadi, Catalunha e Andaluzia) e de outras zonas, particularmente na Bretanha, como na festa bi-anual do mar de Douarnenez onde foi convidada de honra em 2000, ou a de Brest de 4 em 4 anos.
Hoje a Galiza está na vanguarda da recuperação do património marítimo-fluvial e é uma clara referência para as várias federações ibéricas que estão a surgir. Tal como referiu Staffan Mörling em inícios de 2006, esse trabalho “surgiu aquando o da Bretanha francesa ou Noruega, mas não por imitação e sim sempre com mais gente nova que todos os dias mostrava interesse em construír e deitar à água mais dornas” (um dos barcos mais apreciados da Galiza).
A FGCMF nunca teve uma visão nem saudosista nem folclórica do mundo dos mares e dos rios, querendo-os apenas sempre vivos e produtivos. Nunca se pretendeu cantar uns mares e rios fecundos que já passaram à história mas sim nos seus encontros bi-anuais e nos particulares de cada associação, nas diversas campanhas como a de 1996 em prol da carpintaria de ribeira, nas publicações e exposições, a FGCMF trata de valorizar a herança recebida para a fazer crescer em novas e frutíferas vertentes, sempre em contacto com as gentes do mar.
Apelamos para que não diminúa a constante e desinteressada entrega das pessoas que participam nas diversas associações, porque tal é fundamental para o actual movimento de recuperação, revitalização e socialização do património imaterial marítimo e fluvial da Gallaecia. Se na sua defesa o vento surgir pela proa, teremos de bolinar (ou “voltear”, num termo dos velhos pescadores); e se tivermos de perder muito tempo a bolinar, “então baixa-se a vela e põe-se mãos aos remos”.
Com vento de feição ou sem ele, à vela ou sem ela, seguiremos a travessia iniciada pelos pioneiros da diginificação das embarcações tradicionais e sua cultura, tendo sempre presente que o importante não é tanto chegar à sonhada Ítaca, mas sim para a gente da FGCMF a plena socialização e valor de um imenso património que forma a singularidade cultural da Galiza e o realmente mais importante é a viagem e as experiências vividas em cada largada.»
Francisco Fernández Rei – Vice-presidente da FGCMF
Imagens - FGCMF
Este é o texto de apresentação da Federação no seu site oficial e que transcrevi quase na sua totalidade, “aportuguesando-o” numa ou outra parte, sendo que practicamente não há necessidade em tal, mas é necessário que o seu trabalho seja entendido até pelos mais “duros de ouvido” ou de idioma.
Julgo que o texto é muito claro a evidenciar a importância dos patrimónios marítimos e fluviais, tornando-os “vivos” o mais possível. Resumindo, esta fase acima mencionada diz tudo: “A FGCMF nunca teve uma visão nem saudosista nem folclórica do mundo dos mares e dos rios, querendo-os apenas sempre vivos e produtivos”.
Viajando ao tempo em que não havia fronteiras nem mapas a dividir a Península, a antiga Gallaecia incluía o hoje Norte de Portugal e apesar de “dividida” entre dois países actualmente em termos políticos, as gentes e a cultura continuam a ser as mesmas, extremamente ricas à sua maneira. Esta Federação é mais um exemplo de cooperação que me diz um pouco mais que os outros por estar ligado à minha tradição familiar: a pesca e tudo em volta dela.
Neste caso específico, o Norte de Portugal (e todo o país) tem ainda que criar “muitas associações”, pois está(va) também apinhado de barcos como a Galiza. O trabalho de cerca de 15 anos na Galiza já deu muitos frutos e dará mais por certo, e o envolvimento de Portugal no mesmo só ajuda ambos.